Revista Controle & Instrumentação – Edição nº 232 – 2017



¤ Cover Page

Válvulas industriais

 
 
Segundo as maiores consultorias do mundo, o mercado global de válvulas industriais, estimado em US$ 112 bilhões, deve crescer cerca de 4% aa até 2020, acompanhando o lento crescimento da economia mundial. A adoção da manufatura aditiva – ou impressão 3D – e os avanços digitais nos softwares de modelagem são as principais tendências que devem entrar nesse mercado pela porta do reparo, para depois chegar à fabricação de algumas bombas e válvulas. Essas novas tecnologias se somarão a um mercado muito competitivo e já fragmentado com a presença de vários fabricantes internacionais, regionais e diversificados. Os maiores players também devem crescer, mas através de aquisições e aqui no Brasil esse cenário não difere muito, ainda que o setor de válvulas esteja sofrendo há mais de década.
 
 
“Há muitos anos, o setor de válvulas teve um grande acelerador de crescimento: a Petrobras, que através do Cenpes mantinha um Programa de Nacionalização, que cuidava do projeto básico, desenvolvimento e piloto. Assim, a indústria nacional de válvulas cresceu, faturou e apareceu tanto, que empresas internacionais vieram para cá, e estão montando e produzindo no Brasil, por conta do Conteúdo Local. As válvulas chinesas, que brasileiros importavam e vendiam no mercado nacional, repre- Emerson Controle & Instrumentação Nº 232 | 2017 43 sentavam apenas 2% do mercado há 15 anos; hoje, válvulas importadas – não apenas da China, mas de toda a Ásia, EUA e mesmo Europa – somam 70%”, afirma Djalma Bordignon, um dos vice-presidentes da CSVI – Câmara Setorial de Válvulas Industriais da Abimaq – Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos.
   
“De fato, após um longo período de recessão, o maior na história do Brasil, a indústria nacional de válvulas encolheu muito com o fechamento de algumas empresas, e mesmo multinacionais, que fecharam as operações no Brasil, pois, dependiam de grandes projetos. Às que restaram, foi necessária uma forte redução de seus quadros de funcionários em função da intensa queda de consumo dos principais consumidores de válvulas”, comenta Marcos Benfatti, diretor da YGB – executivo há mais de 30 anos no mercado.
 
Se o setor de válvulas vem sofrendo há mais de uma década, há cinco anos a situação ficou mais crítica, com o início da Operação Lava Jato, que parou os negócios no país e fez despencar em 50% o faturamento das indústrias de válvulas – mesmo com a divulgação de grandes projetos, que encheram as páginas dos jornais, porque os acordos internacionais trouxeram de fora equipamentos, produtos e tecnologia em regimes especiais, com isenção de impostos. Essa situação sempre foi apontada como negativa para o país pela Abimaq – que continua pedindo isonomia de tratamento entre equipamentos importados e nacionais, não privilégios, para participar em igualdade de condições.

“Esse investimento vem do BNDES, que está pagando essa conta, e por isso se deve exigir uma concorrência leal, com geração de empregos e impostos no Brasil. Com esses investimentos, quem sabe o parque fabril brasileiro de válvulas possa ter capacidade de atender às demandas, pois hoje não tem condição de suprir sozinho nem 50% da demanda de válvulas”, afirma Djama. “Isonomia de custos de produção, comparado com os preços das válvulas importadas, é fundamental para o setor sobreviver”, concorda Benfatti.
 
“Conteúdo Local é um assunto muito complexo, mas, em princípio, acredito que prejudicou a empresa estabelecida no Brasil, incentivada no passado para atender o segmento de Oil&Gas – o segmento com maiores investimentos anuais. Sem o Conteúdo Local, o faturamento das empresas nacionais diminuirá significativamente”, reflete Luis Franco, responsável pela Westlock no Brasil.
 
Luiz Henrique Pereira, gerente geral de vendas de Instrumentação da Yokogawa América do Sul, afirma que “o Conteúdo Local gera empregos e receita para o Brasil e, apesar de sermos uma empresa multinacional, atendemos aos requisitos para o Conteúdo Local. A Yokogawa não atua diretamente no mercado de bombas e válvulas, mas, em grande parte das especificações dos projetos dos nossos clientes, é necessária a aplicação desses produtos, fazendo com que, de um modo geral, eles complementem nossa linha de soluções para automação industrial”.
 
“O desafio futuro é o crescimento, mas, sem uma política clara e estável de requisitos técnicos e de conteúdo local, que permita investimentos de longo prazo e desenvolvimento local da indústria, permaneceremos um país de “commodities” afirma Paulo Sergio Poffo, Diretor de Vendas e Marketing da Leser.
 
O assunto é de fato polêmico.

“Existe uma controvérsia sobre o fim ou não do Conteúdo Local e o impacto na arrecadação e geração de empregos, causando insegurança para novos investimentos em óleo e gás. O desenrolar das investigações da Lava Jato e os problemas de gestão e queda dos preços do petróleo só aumentaram essa incerteza; não vemos claramente a melhora nesses benefícios com a manutenção do CL e é uma porta aberta para corrupção. A Emerson, como empresa global, tem fabricação em vários países do mundo, incluindo os de baixo custo, o que nos habilita a fornecer válvulas de fora para o mercado no Brasil com preços competitivos; então, qualquer mudança não afeta a participação da Emerson nesse mercado, porém deve haver isonomia e um critério justo de qualidade e segurança ao atendimento dos requisitos, para que não abra possibilidade de qualquer empresa não qualificada participar. De qualquer forma, como há cinco anos a Emerson fez um grande investimento na fábrica no Brasil para atendimento ao Conteúdo Local, o fim do CL prejudicaria essa operação local”, comentam Claudio Neves e Fabio Ferreira, respectivamente diretor e gerente de negócios de Final Control da Emerson – que detém um amplo portfólio de válvulas e elementos finais.
 
 
Claro, não existe apenas o setor de óleo e gás. A indústria – e a de válvulas incluída – conta com vários setores da economia para alavancar a produção. E o VP da Abimaq lista: o agronegócio, que cresceu 25% em 2017; embalagens, alimentos e bebidas, que subiu 15%; papel e celulose, com seus ciclos de projetos e saneamento – está muito bem e ainda vai melhorar. Djalma conta que só a Sabesp deve investir mais de R$ 500 bilhões nos próximos 20 anos em projetos de redução de perdas e qualidade da água.
 
“O setor de energia também requer muito investimento. O Estado de São Paulo já estaria numa situação crítica, não fosse a crise e a economia fraca. Mas a reação já vem vindo. O Governo do Estado vai fazer duas térmicas (totalizando 1.9 MW) em Piratininga, que vão consumir 14 milhões m3 de gás, em conjunto com a Shell. Mas o Estado já consome 15 milhões de m3 do gás que vem da Bolívia; então, vai ter de trazer gás através de um porto de GNL em Santos, que vai precisar de uma planta de tratamento para esse gás. Isso é importante para toda a cadeia! Com investimentos, a indústria de válvulas em geral conseguirá retomar seu crescimento. Há carência de uma Política Pública com visão de longo prazo, que dê segurança a investidores, fator sine qua non para que a indústria nacional volte a ter crescimento, pois os famosos Planos de Governo não irão corrigir as falhas”, aponta Djalma.
 
De maneira geral, os fabricantes de válvulas e elementos finais começaram a sentir uma leve melhora nos negócios – que parece deve continuar!

“Atuamos em praticamente todos os segmentos que necessitam de válvulas industriais para controle de fluxo. No último semestre de 2017, alguns segmentos tiveram um pequeno, mas constante, aumento de demanda, como o caso das áreas de Óleo & Gás, Álcool & Açúcar e do setor Químico e de Saneamento”, comenta Benfatti “Westlock fornece válvulas de todos os tipos e atende diversos segmentos, com certificados Inmetro, mas podemos dizer que, em 2017, o crescimento aconteceu na área de processos não Oil & Gas”, afirma Franco.

“O Mercado Brasileiro mudou e continua em transição, os fabricantes de válvulas e equipamentos que tinham muita dependência do segmento de óleo e gás e de grandes projetos sentiram fortemente o impacto dessa mudança acontecida em um curto espaço de tempo. Nós, da Leser, obtivemos sucesso em grandes projetos nos segmentos Onshore e Offshore nos últimos anos, e, assim como os demais fornecedores, sentimos a redução drástica da demanda nesses segmentos.

Entretanto, como toda crise gera oportunidades, ao mesmo tempo em que grandes empresas encerraram suas atividades no Brasil, aconteceu uma oferta mais realista, o que viabilizou nossos investimentos em uma nova planta industrial no Rio de Janeiro, em 2016. Com nossa capacidade ampliada, investimos fortemente na reestruturação e otimização de processos, custos e atuação comercial para compensar as variações do segmento de óleo e gás. A Leser completa 200 anos e já enfrentou as maiores crises mundiais; no Brasil, com 20 anos, nossos investimentos demonstram nossa confiança no país e em nossos clientes,” conta Poffo.
 
Claudio Neves, e Fabio Ferreira, respectivamente, diretor e gerente de negócios de Final Control da Emerson, respectivamente, ressaltam que, nos últimos anos, a grande maioria dos segmentos industriais foi impactada pela crise econômica no Brasil, com a falta de investimentos em projetos. “Aqui no Brasil, focamos em confiabilidade operacional, serviços de manutenção, reparos e diagnósticos de válvulas. Isso nos trouxe um certo crescimento junto às petroquímicas e mesmo no setor de óleo e gás e outros. Mas, para nomear um segmento, seria o de distribuição de gás”.
 
Como bem pontua Djalma Bordignon, quem investiu em tecnologia pode acompanhar a retomada dos negócios, ainda que com algumas desvantagens relativas ao Custo-Brasil. “Estamos entrando na quarta revolução industrial, a chamada Indústria 4.0, e ainda que o custo de uma válvula seja 50% a fundição, quem não se adequar à produção inteligente, compartilhada, virtualizada, não sobreviverá. Os serviços compartilhados são o futuro”. Os mercados querem soluções, e não mais apenas produtos e equipamentos. Hoje, os serviços – engenharia, montagem, manutenção – são requisitos básicos. E os fabricantes nacionais precisam se preparar para essa virada!

“As principais tecnologias envolvidas nos processos de produção das válvulas estão relacionadas às normas de fabricação, software de dimensionamento. Na engenharia, já utilizamos softwares de análise de performance estrutural e fluido dinâmico, bem como de modelamento 3D. Aqui, na YGB, estamos acompanhando as demandas técnicas e tecnológicas dos nossos clientes”, conta Benfatti. “A Emerson oferece soluções de serviços de diagnóstico, monitoramento, e relatórios on line das válvulas. Com aplicações de hardware, software e posicionadores inteligentes, garantimos com segurança o tráfego de dados para implantação de IIoT com acesso às válvulas do cliente pelos nossos experts. Mas, o mercado ainda atua de forma receosa em relação a várias novas tecnologias disruptivas, como wireless, por exemplo”, comentam os executivos da Emerson.

“Ainda não trabalhamos com algumas tecnologias aqui, devido em parte ao conservadorismo dos segmentos que atendemos, mas estamos atentos aos movimentos e demandas de mercado”, pontua o executivo da Westlock. Válvulas de injeção química têm sido tradicionalmente operadas manualmente no setor upstream. No entanto, há casos em que isso já foi automatizado, utilizando uma solução de medidores e válvulas de controle. No primeiro caso, as válvulas tinham de ser frequentemente abertas, fechadas e ajustadas pelos operadores da planta, o que é caro, pois necessita da contratação de pessoal adicional e é um trabalho feito sob condições ambientais muito difíceis no campo. A dosagem imprecisa e instável de substâncias químicas leva a custos operacionais e desafios com processos específicos. Para direcionar e resolver estes problemas, há um incremento de demanda por soluções automáticas de injeção integradas que performem estavelmente e ofereça um alto nível de precisão na dosagem – vide o investimento previsto pela Sabesp. Ou seja, à medida que as tecnologias caminham para a IoT, está ocorrendo a digitalização dos processos, através da qual o uso de Big Data e Inteligência Artificial está gerando percepções valiosas, necessárias para a tomada de decisões comerciais.

“A Yokogawa lançou recentemente um sistema para injeção de químicos em plataforma de petróleo, uma tecnologia patenteada para controle, composta por um medidor de vazão e uma válvula, integrados em substituição ao conjunto medidor e válvula de bloqueio. O sistema é capaz de estabilizar injeções químicas em pequenas quantidades requeridas. Não é necessária manutenção regular e são fornecidas características remotas de controle. Também anunciamos um novo conceito de negócios de automação industrial e controle, que expressa claramente o compromisso da Yokogawa em usar as tecnologias de informação mais recentes, e suas décadas de experiência com processos industriais e gerenciamento de plantas, portfólio de soluções em automação e experiência em consultoria, para ajudar seus clientes a transformar seus negócios”, conta Luiz Henrique.

Mas, como escolher uma válvula? E sua automação? A escolha de um equipamento qualquer, de uma válvula, deve ser feita através da engenharia de aplicação, levando em consideração dados de processo, como fluido, pressão, aplicação, criticidade, temperatura, etc.

Segundo Marcos Benfatti, a principal ferramenta é o programa de dimensionamento que cada fabricante de válvulas possui, contendo as características técnicas de sua linha de produtos. “Mas as válvulas podem ser manuais, elétricas, pneumáticas... A YGB trabalha com a linha completa de válvulas manuais, elétrica, on-off, e controle, atendendo a maioria dos processos industriais. E acreditamos que a principal característica da escolha do processo de automação se baseia no detalhamento técnico dos clientes, que leva à proposta mais adequada”. Franco, da Westlock, afirma que a escolha de uma válvula ou outro equipamento envolve diversas variáveis de processo e classificação de áreas. “Se é melhor uma válvula manual, elétrica ou pneumática, também vai depender do processo, da velocidade de atuação, infraestrutura local, etc. E, sobre a automação, também depende do controle que se deseja, desde uma automação simples de abertura e fechamento (on/off), controle da variável de processo através de válvulas de controle, controle de válvulas de emergência com funções avançadas, como PST Partial Stroke Test, para válvulas críticas. Também nesse momento o detalhamento do projeto e a confiança no fornecedor são importantes”.

“A Emerson possui um grupo de engenharia para cotação de especificação de válvulas com utilização de softwares de dimensionamento e cálculos para a melhor solução ao mercado. Essa mesma engenharia pode ajudar a especificar se a válvula pode ser manual, ou se é mais indicada uma hidráulica ou elétrica. E a automação depende muito do sistema de controle do cliente, porque alguns trabalham com redes sofisticadas como Foundation Fieldbus, Profibus, etc., e outros têm um mínimo de automação em suas plantas. O melhor é sempre o que se adequa à necessidade”.

Djalma Bordignon reflete que, se o mundo não compra mais produtos, se quer soluções que aumentem sua produtividade; se esse mundo está mudando rápido e sua matriz energética vai ser outra daqui a poucas décadas, é preciso estar sempre se atualizando. “Existe sempre uma válvula em qualquer produto – pequenas ou grandes. Não existem fronteiras para tecnologias e produtos. É preciso fazer a lição de casa todo dia, atualizar os negócios e as relações. Estar atento. Porque, mesmo com as dificuldades que algumas políticas criam para as empresas brasileiras, a perspectiva é de retomada do crescimento.”
 
 
 
 
 
 
 
LEIA MAIS NA EDIÇÃO IMPRESSA

DESEJANDO MAIS INFORMAÇÕES: redacao@editoravalete.com.br
Clique na capa da revista para
ler a edição na íntegra


© Copyrigth 2001 – Valete Editora Técnica Comercial Ltda – São Paulo, SP