Revista Controle & Instrumentação – Edição nº 156– 2010

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Modelo de fábrica


Engenheiros partem da automação para modelar projeto
e aumentar índices de produtividade e qualidade em nova
fábrica da Sadia


“Um projeto complexo como este precisa de novas formas de gestão da tecnologia”. Os diretores ouviram e aceitaram o argumento de Francisco Salvador, um engenheiro que há dez anos cuida da automação das fábricas da Sadia. Os 16 meses que se seguiram foram de incontáveis reuniões e workshops, em que participaram onze profissionais da própria Sadia – gente que conhecia do processo, dos produtos, de automação e manutenção – além de duas dezenas de fornecedores e consultores. A proposta era construir uma nova fábrica de farinhas de empanamento. Fabricar esse tipo de produto – uma mistura de farinhas derivadas de cereais e outros microingredientes, utilizada principalmente nos frangos empanados vendidos nos supermercados sob a marca Nuggets – não é segredo para os engenheiros da Sadia. O desafio era viabilizar inovações tecnológicas, tanto no produto quanto no processo, que pudessem gerar valor para a companhia e agregar qualidade ao produto final.

Houve uma primeira rodada para a prospecção de novas tecnologias e metodologias de gestão do conhecimento e gestão de projetos com enfoque em tecnologia e complexidade, diferentemente dos projetos tradicionais. Com a prospecção da tecnologia definida, não restavam muitas dúvidas de que o projeto de automação, pela necessidade intrínseca de modelar processos e produtos, seria o catalisador natural nessa tarefa. “Imaginávamos que, através do projeto de automação, teríamos uma solução para o problema de gestão da tecnologia, porque nos projetos, muitas vezes, um técnico não consegue enxergar as demandas de seus colegas”, lembra Salvador.

A nova fábrica opera desde maio do ano passado, e já é a mais rentável das unidades da Sadia: o projeto elevou os índices de eficiência para 95%, dobrou a produtividade por homem/hora e, de quebra, elevou os índices de qualidade. Combinação perfeita entre áreas de engenharia, processo e produto, o trabalho virou um exemplo de atualização tecnológica citado nos encontros internos da Sadia como parâmetro para os novos projetos de inovação. Da fabrica localizada em Toledo / PR saem mais de 15 produtos diferentes, com tecnologia desenvolvida internamente – baseada em conceitos importados da indústria automobilística. A premissa básica desse projeto era dar um salto tecnológico. “Fomos buscar no Gamp alguns conceitos básicos. Extraímos o Modelo V como o modelo de ciclo de vida de projeto, identificamos os requisitos, priorizamos e criamos mecanismos para validar isso a cada etapa”.

Ao longo do projeto foram modificados 44 pontos de diversos equipamentos e cinco equipamentos foram especialmente projetados para atender às inovações de processo. Toda a linha foi integrada a um sistema de supervisão fonecido pela Rockwell Automation – com dois CLPs principais se comunicando em ethernet IP e instrumentos e CCMs ligados em Devicenet, totalizando 900 pontos de entrada e saída e 265 nós de rede. Essa integração ocorre no nível de controle do processo, gestão da performance e gestão da produção. No nível de controle, permite um roteamento automático do processo de produção – e interação entre as máquinas, que “sabem” o momento de parar ou acelerar o torque.

No nível de gestão de performance, permite a automação dos indicadores de produção e no nível de gestão da produção, permite a programação e controle da produção. Integrar duas dezenas de fornecedores sob um mesmo sistema, definitivamente, não é algo trivial – e que, na maioria dos casos, acaba sendo deixado de lado por falta de mão-de-obra dedicada e dificuldades de implantação. Acontece que a integração de máquinas está muito mais próxima – porque secadoras, moedoras e extrusoras já saem de fábrica com pelo menos um CLP embarcado. Independente da construção da nova fábrica, a Sadia já manifestava o desejo de padronizar seus fornecedores – um trabalho iniciado em 2004 por Salvador e seu colega Airton Dala Costa, que estavam alocados na área elétrica, e que acabou se estendendo para toda a operação. Foi a forma encontrada para agilizar os processos de contratação, viabilizar soluções técnicas mais avançadas e reduzir custos de aquisição e manutenção. Um levantamento da base instalada evidencia essa necessidade: são 120 mil pontos de controle, 15 mil equipamentos em rede, 650 IHMs e 175 sistemas instalados em 13 fabricas. Por isso foram sendo criadas arquiteturas padrão para as diferentes linhas de produção e firmados contratos de fornecimento com fabricantes – majoritariamente Schneider Electric, Siemens e Rockwell Automation.

“Temos visto que com essa padronização e com esse tratamento a automação tem se tornado muito mais barata”, pontua Salvador. Aos poucos, essa cultura ganha força dentro da empresa – num negócio repleto de processos e produtos diferentes, a saída é adotar padrões. Foi assim com a produção de margarina e de farinha empanada. O próximo será a produção de ração – processo em que eficiência e produtividade são palavras-chave para viabilizar um negócio. O Modelo de Referência de Automação para as fábricas de ração já está pronto – foi projetado com base nos conceitos da norma ISA S95, e aguarda o investimento que será erguido em Francisco Beltrão / PR para sair das planilhas para a vida real. A Sadia já teve uma experiência bem sucedida com a adoção da ISA S88 – norma para o controle de bateladas predecessora da ISA S95 – na fábrica de margarinas de Uberlândia / MG, quando os engenheiros da empresa trocaram o tradicional Graph7 pela Simatic- Batch, da Siemens.

Via de regra, a abordagem tem sido o desenvolvimento de modelos “como é / como será” – baseado na construção do fluxo de processo atual a partir do questionamento das funções de interesse e das práticas gerenciais das fábricas em operação. “Paralelamente temos buscado consolidar a questão do projeto de software. Somos muito focados em requisitos de produtos e instalações, ficando o projeto dos processos de trabalho muitas vezes em segundo plano. Há ainda muito a ganhar no projeto de requisitos”, avalia Salvador. Pela avaliação da área de automação passam 7% dos investimentos da Sadia – esse valor, calculado pelo engenheiro, diz respeito ao conteúdo médio de automação embarcada nos custos totais, sejam projetos de expansão ou de reposição, que não saem do papel sem um parecer das áreas técnicas.


Informação disponível

Os avanços tecnológicos também permitem trabalhar com uma quantidade muito maior de informações. Um simples CLP, se já não estiver em padrão ethernet, pelo menos vai se comunicar em Profibus – esse protocolo que ganhou espaço na indústria de alimentos a reboque das unidades remotas e das IHMs, e acabou se alastrando para os transmissores. 87% dos dados que fazem parte do dia-a-dia de supervisores e gerentes da fábrica de farinhas da Sadia estão disponíveis nos sistemas. Esse é o ponto de partida da revolução na gestão dos processos que a automação vai mobilizar dentro da empresa – para automatizar todos os relatórios que, literalmente, ainda são feitos na mão. Mesmo não tendo um sistema MES, já é possível obter informações sobre qualidade, eficiência, KPIs, e até ordens e apontamentos de produção. “Fomos o mais longe que pudemos extrair do sistema supervisório”, ressalta o engenheiro. Os relatórios dos sistemas de supervisão permitem, por exemplo, atender aos requisitos do Serviço de Inspeção Federal - SIF, que rege a inspeção de alimentos no Brasil, e sua correlata European Food Safety Inspection Service, ou até mesmo a Good Manufacturing Practice - GMP, que padronizam os registros na indústria de alimentos e fármacos.

O desafio agora é pensar em índices de disponibilidade, produtividade e qualidade a partir da linha de produção, para atingir o retorno esperado para os investimentos. Várias áreas contam com sistemas piloto – no caso da produção de farinha, por exemplo, os KPIs medem formulação e rendimento, e no abatedouro de aves, além do controle e conformidade e custos, existem KPIs do abate. Só que a extração dessa informação ainda não é automática. A comunicação com o ERP é feita por troca de arquivos- padrão TXT criados nas fábricas – a transferência dos dados para o SAP é controlada por um servidor localizado no Data Center central.

Mas a área de automação quer ampliar a integração com a área de TI – além da sinergia na questão de redes e controles de acesso, e uma crescente demanda pelos KPIs do processo, o modelo de governança de TI pode solucionar problemas recorrentes na automação. A áreas de Tecnologia e de Operações da Sadia até aprovaram uma proposta de governança na área de automação – que já vinha ganhado atenção por conta do crescimento da base instalada na produção e das demandas tanto do negócio quanto da cadeia de suprimentos. O problema é que esse trabalho foi feito em novembro de 2008, em meio à crise econômica global. Pouco tempo depois, a fusão da empresa com a Perdigão adiou mais uma vez a mudança.

É bem provável que, diante do crescimento da nova empresa e das novas perspectivas do mercado, tudo isso seja acelerado. É uma grande janela de oportunidades, que será ocupada por quem conseguir oferecer sistemas que tenham flexibilidade suficiente para dar suporte à diversidade de processos e receitas, e gerar informações de forma automatizada.


 
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