Revista Controle & Instrumentação – Edição nº 218 – 2016



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NR 12 e Segurança na Manufatura

 
 
A Norma Regulamentadora NR 12 é a regulamentação da Lei nº 6.514, de 22 de dezembro de 1977, e especificamente na seção XI – Das Máquinas e Equipamentos, os Art. 184, 185 e 186 da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, tem redação vigente dada pela Portaria no 509 de 29 de abril de 2016. Ela e seus anexos definem referências técnicas, princípios e medidas de proteção para garantir a saúde e a integridade física dos trabalhadores. Embora o não cumprimento acarrete penalidades, ainda não existe um organismo certificador acreditado pelo Inmetro para comprovar se as máquinas e equipamentos estão adequados à NR 12 – o que seria muito interessante, especialmente para resolver as dúvidas e discussões relativas às máquinas importadas. Vale lembrar que, para importar, além de adequar máquinas e equipamentos às normas brasileiras e providenciar manuais em português, é preciso ter à disposição um corpo técnico no Brasil e peças de reposição. E, se a empresa vendeu máquina ou equipamento importado, é preciso fazer o recall para adaptação porque a responsabilidade legal se aplica.

Componentes de segurança como cortinas de luz, botoeiras de segurança, scanners e outros, também não têm como ser certificados pois o Inmetro ainda não emitiu Procedimentos e não acreditou Organismo Certificador para emitir Certificado de Conformidade de componentes de segurança, assim como não existem laboratórios nacionais credenciados para a realização dos testes necessários – mas vale ressaltar que as empresas que possuem subsidiárias no Brasil, de origem europeia e norte americana, possuem certificações em organismos internacionais. Alguns países possuem certificação para componentes de segurança, e uma das alternativas para os componentes importados é a solicitação de comprovação de Certificação por Organismos e laboratórios internacionais; mas, para componentes nacionais não existem meios de certificação local, então, uma das alternativas seria o envio do componente nacional para testes e certificação em laboratório internacional.
 
A Abimaq tem cursos regularmente sobre a NR 12. Na foto, Sidney Peinado durante um treinamento de dois dias
 
Sidney Esteves Peinado, um dos instrutores dos cursos sobre NR 12 da Abimaq, conselheiro do Depar Leste da Fiesp e diretor técnico da Fast Solution Automação e Segurança, comenta que hoje, a norma NR 12, ao contrário do que se tem dito, não está parada ou suspensa, e a fiscalização continua em todos os seguimentos. “Ela vem de uma portaria 3214 de 1978 e foram publicadas 36 normas regulamentadoras sobre saúde e segurança do trabalhador. De 1978 para cá a tecnologia evoluiu e as normas ficaram defasadas. Ela não é novidade, tanto que os itens mais notificados, autuados e interditados ainda são os mesmos de 1978, mas com conceitos técnicos melhorados. Estatísticas do Ministério do Trabalho e Previdência Social – MTPS, mostram que os itens cobrados hoje – atualizados – são os mesmos de 1978. Mas muitas empresas não estão adequadas e quem está preocupado agora é porque está sob risco de fiscalização”, comenta Sidney, que assessora sindicatos patronais, para essa finalidade.

Vale lembrar que a Norma não busca proteger a máquina, foi feita para proteger o trabalhador. E isso vale também para máquinas importadas – que foram feitas para operadores com culturas e comportamentos diferentes dos nossos. Por isso é necessário fazer pequenos ajustes, sempre baseando na Apreciação de Risco, no ciclo de vida de segurança, aplicados aos usuários locais. O comportamento e o treinamento são pontos sensíveis quando se trata de segurança. Roberto do Valle Giuliano, da Fundacentro, já ministrou para a Cetec Centro Paula Souza, uma oficina sobre Apreciação e Redução de Risco em Máquinas que faz menção sobre estas normas. É preciso saber e multiplicar as novas posturas.

A aplicação da NR 12100 e da ISO 13849 para Apreciação e Redução de Riscos, trabalham com o conceito de falha perigosas e a habilidade das partes de sistemas de controle relacionadas à segurança de realizar uma função de segurança sob condições previsíveis, através dos níveis de performance (Performance LeveI – PL), definidos em termos de probabilidades de falha perigosa por hora. Então, ainda que a ISO 13849 esteja em fase de tradução pela ABNT, não deve ser considerada em desacordo com a NR 12, pois em breve fará parte de arcabouço técnico nacional.

Sidney reforça: “a NR 12 não vai ser extinta até porque os fiscais podem usar a CLT como base e a portaria 3214, norma resumida: um auto de interdição é bem embasado e começa com “de acordo com a CLT 184/186, Constituição Federal art.197, resolução 119 e segue”. Então, sem as NRs, dá no mesmo. Logo, é preciso atualizar a segurança já”.
 
 
Antigamente fiscais de saúde e segurança eram médicos e engenheiros, mas hoje não; por isso foi preciso revisar as Normas Regulamentadoras que foram revistas de acordo com os segmentos onde existiam acidentes fatais, lesões graves etc., começando pelo segmento que mais figurava na estatística no MTPS: a NR18 aplicada às condições e meio ambiente de trabalho na indústria da construção; depois NR 10 – segurança em instalações e serviços em eletricidade; seguida pela NR 12 – Segurança no Trabalho em Máquinas e Equipamentos; e agora estão em revisão três anexos da NR 15, por conta de vibração, ruído e temperatura.

Roberto do Valle Giuliano, da Fundacentro, lembra que a construção da nova NR 12 foi fundamentada em normas nacionais e internacionais consolidadas e já existentes há anos, tendo buscado, dentre outras coisas, harmonizar a legislação nacional com as normas internacionais, até para dar um tratamento equânime entre as máquinas nacionais e as importadas. E, para deixar mais clara a interpretação, exclui-se o termo falha segura da NR 12 e inclui-se o conceito de estado da técnica e a correlação entre categoria de segurança e níveis de performance (Perfomance Level – PL), sendo este último ponto especialmente relevante em razão da possibilidade de estarem ocorrendo interpretações equivocadas de que máquinas novas, fabricadas na Europa seguindo normas internacionais ISO ou IEC, ou ainda EN tipo C harmonizadas.

Falha segura é um princípio de segurança aplicado em diversas áreas da engenharia, refere-se a um dispositivo ou sistema em que, em caso de falha, responde de maneira a não causar dano, ou o mínimo dano, a outros dispositivos ou pessoas. Então, um sistema que atenda a esse princípio previne ou mitiga consequências inseguras da falha, ou seja, se e quando falhar, ele permanecerá seguro ou pelo menos no mesmo nível de segurança de quando está operando normalmente.

Mas, com a publicação das normas ISO 13849-1 e - 2, seguidas da publicação da ISO 12100:2010 (Safety ofmachinery – General principIes for design – Risk assessment and risk reduction), recentemente publicada pela ABNT como norma ABNT NBR ISO 12100, passou-se a trabalhar com o conceito de falha perigosa, definido como qualquer mau funcionamento na máquina ou no seu fornecimento de energia que eleve o risco, ou como uma falha que tem o potencial de levar as partes de sistemas de controle relacionadas à segurança a um estado perigoso ou de falha de função. Desse modo, a habilidade de uma função de segurança sob condições previsíveis está alocada em cinco níveis, chamados níveis de performance (PL), definidos em termos de probabilidades de falha perigosa por hora. Uma vez que são possíveis muitos tipos de falhas, quando utilizado o princípio da falha segura é recomendável que se especifique a que falhas o dispositivo deve ser resistente. Entretanto, considerando que a NR 12 estabelece princípios gerais de cumprimento obrigatório, não cabendo a ela detalhar aspectos construtivos, retirou-se o termo da norma.

Giuliano ressalta que apesar de o Brasil ainda seguir o disposto na norma ABNT NBR 14153 (Segurança de máquinas – Partes de sistemas de comando relacionadas à segurança – Princípios gerais para projeto), aplicável indistintamente a máquinas novas ou usadas, a ISO 13849 já está vigente na Europa, nos Estados Unidos e em outros países, sendo que a manutenção do termo falha segura na NR 12 poderia causar conflitos técnicos e barreiras comerciais, o que certamente não é desejável. A retirada do termo falha segura da NR 12, porém, não causa prejuízos, vez que a norma ISO 13849, em fase de tradução pela ABNT, engloba a metodologia vigente, prevista na norma NBR 14153, baseada em categorias de segurança.

Resumindo: a exclusão do conceito de falha segura da NR 12 não traz prejuízo para a aplicação da norma; as máquinas importadas fabricadas com os conceitos da ISO 13849 não devem ser consideradas em desacordo com a NR 12, pois existe correlação entre os conceitos de Categoria de Segurança e Performance Level; na ausência de disposições específicas na NR 12, nas normas nacionais e nas normas internacionais, as normas harmonizadas EN do tipo “C” podem ser consideradas como aplicação do estado da técnica previsto na NR 12.

Lourenço Righetti, responsável pela NR 12 na Abimaq – Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos, comemora a evolução nas negociações junto à Comissão Nacional Temática Tripartite responsável pela norma. “Depois de um ano e meio de paralização, alguma coisa evoluiu e as negociações foram retomadas. Algumas premissas defendidas pela CNI em conjunto com a Abimaq foram acatadas; outras ainda estamos lutando para obter. Um pleito específico da Abimaq e que já está vigente por exemplo, é o que isenta as máquinas destinadas à exportação a atender a NR 12 e sim às normas do país para onde serão exportadas. Isso foi importante porque era proibido fabricar fora da NR 12, não importava a finalidade. ”

A CNI enviou carta ao Ministério do Trabalho, com a qual a Abimaq concorda na íntegra, carta esta de 6 de fevereiro de 2014, solicitando criar no corpo da norma uma diferenciação para microempresas e empresas de pequeno porte, pelo menos na parte burocrática. “Depois de muita luta isso foi alcançado e algumas exigências foram eliminadas como por exemplo refazer um manual de máquina que tenha sido perdido ou que não veio na compra de uma máquina usada por exemplo; a obrigação agora é ter pequenas fichas de segurança para as áreas críticas da máquina. Isso já está na norma. Tirar a exigência de fazer lay out da fábrica para micro e pequenas empresas também. E para se enquadrar, basta olhar a Lei Complementar 123, o tamanho é dado por faturamento”, conta Sr Righetti.

Uma alteração muito importante que ainda está sendo requisitada pela Abimaq e CNI é separar a norma em duas: uma destinada aos fabricantes e outra aos usuários.

“Na nossa proposta pegamos o texto da norma atual vigente, sem excluir nada, fizemos dois textos separando o que se destinava somente a usuário e somente a fabricante e o que se destina aos dois, mas o Governo não aceitou. A norma atual engloba as duas coisas e complica a interpretação sobre onde começa e onde termina a responsabilidade de fabricante e usuário. Por exemplo, quando alguém projeta e fabrica uma máquina, utiliza conceitos e normas de segurança; quando alguém compra essa máquina e a instala, deve fazer uma nova Apreciação e Análise de Risco do processo produtivo onde essa máquina foi instalada, mas o responsável por isso é o usuário, ainda que ele entenda que quem tem que fazer isso é o fabricante. Veja que ambos – fabricante e usuário – têm que fazer análise de risco, mas em momentos diferentes, só que a norma não é clara sobre essa separação”, comenta Sr Righetti.

Um outro exemplo seria a instalação de um robô no meio de uma linha de produção. O robô em si não tem sistema de segurança, mas o integrador/usuário precisa fazer uma análise de risco nesse ponto da linha, a responsabilidade é do usuário – ainda que o robô seja da nova geração de robôs colaborativos. Ou seja, não basta comprar uma máquina com ART, é preciso fazer uma nova ART quando da instalação.
 
Projeto de layout para uma célula robótica, onde são visualizados alguns dispositivos de segurnaça. São consideradas duas barreiras físicas (B1)
Fonte: CT_CEAUT_IV_2014_01
 
Outra medida que Abimaq e CNI estão pleiteando é tirar do auditor fiscal a autoridade de interditar uma fábrica; ele poderia apenas solicitar a interdição. E, segundo o executivo da Abimaq, porque muitas vezes ele não é um profissional habilitado para chegar a essa conclusão; não que o auditor esteja agindo de má fé, mas por desconhecimento ou mesmo temor de que se não fizer nada, pode ser avaliado como prevaricação. “Ou seja, o que estamos pedindo é que, em constatando uma situação de grave e iminente risco, o auditor solicite a inspeção de um profissional especializado que faria um laudo circunstanciado, e a interdição deveria ser determinada pela Superintendência Regional do Trabalho. Porque o auditor interdita um projeto de um engenheiro sem ser engenheiro. Sabemos que uma lei não pode alterar uma norma, mas pode sustar a aplicação dessa norma ou de um capítulo dela. Estamos pedindo uma Lei que suste a autoridade do auditor interditar, e isso o Legislativo pode fazer”, ressalta Sr. Righetti.

Uma outra proposta ainda não aceita é a alteração do corte temporal para aplicação da norma já que a grande atualização da NR 12 aconteceu em 2010, e no período de 1978 a 2010 máquinas eram fabricadas segundo as normas vigentes na época. CNI e Abimaq ressaltam que aumentou o volume e o detalhe da norma e pleiteiam que se uma máquina foi fabricada até 2010 segundo as normas vigentes deve estar isenta da obrigatoriedade do recall. “Isso é importante porque a partir do momento em que a NR 12 foi atualizada pela Portaria nº 197 de 17 de dezembro de 2010, praticamente todo o parque nacional de máquinas ficou ilegal porque a lei é retroativa – e é isso que queremos que mude afinal, um automóvel de 1980 não tem air bag e nem é possível instalar um nele então a lei só vale para os novos, não é retroativa. Queremos a mesma lógica para as máquinas”.

Mas compensa fazer um retrofit? Segundo Sidney, depende da máquina, do que precisa ser feito. Primeiro deve-se fazer um levantamento sobre o status da máquina e uma Apreciação de Riscos – que vai determinar em qual categoria a máquina deve se enquadrar e a partir daí é que se definem as alterações – se é preciso uma cortina de luz, um botão, uma grade, mudanças elétricas ou automação. No caso da automação, o cuidado deve ser redobrado porque os detalhes não são digitais: dispositivos de paradas de emergência, por exemplo, devem ter reset mecânico. E existem requisitos específicos para a aplicação de CLPs.

Contratar especialistas para cuidar da adequação à NR 12 é muito vantajoso. Basta atentar para a sobreposição de normas que acontece, dependendo de cada máquina ou equipamento. Um bom exemplo são os componentes pressurizados – qualquer um que possua armazenamento de ar e mangueiras pressurizadas –, que acabam se enquadrando na NR 13 e que precisam de travamento de mangueiras. E ainda os problemas com vibração, ruído e calor (NR 15), líquidos inflamáveis (NR 28), ou doenças devido a exposição ao frio (NR 36), sem esquecer os manuais, sinalização e os comandos em português do Brasil.

E mesmo que o Brasil não tenha norma para pictogramas – muito utilizados em máquinas de alimentos e fármacos – é preciso rotular em português, ainda que os pictogramas tenham nomes diferentes em diferentes partes do Brasil.

Parece simples, certo? Mas não é tanto se verificamse as causas primárias de falhas dos sistemas de segurança: 44% acontecem por especificações erradas; 20% por mudanças depois do comissionamento; 15% por erros de operação e manutenção; 15% por erros de projeto e implementação; 6% por erros de instalação e comissionamento.

“Cerca de 80% do nosso trabalho é retrabalho, que significa empresas contratadas não conhecedoras da matéria.

Uma dica para um autoexame é seu plano de manutenção, inspeção e reparos. Não tem? Fica óbvia a postura reativa e indica um parque instalado malcuidado. Vale lembrar que os sistemas de segurança devem ser selecionados e instalados por profissionais qualificados, legalmente capacitados, habilitados e autorizados. Esses profissionais vão poder recomendar a intervenção adequada e são responsáveis pelas ARTs, Anotações de Responsabilidade Técnica, instrumento obrigatório para identificar a responsabilidade técnica pelas obras e serviços prestados por profissionais ou empresas. A ART também não é novidade, foi instituída pela Lei n° 6.496, de 7 de dezembro de 1977, e estabelece que todos os contratos referentes à execução de serviços ou obras de engenharia, agronomia, geologia, geografia ou meteorologia deverão ser objeto de anotação no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia – CREA, está prevista no capítulo 12.39 Sistemas de Segurança no item “b” da NR 12 e deve ser emitida no CREA.

Sobre as máquinas importadas, a Abimaq postula que os órgãos competentes coloquem uma barreira no Ciscomex que impeça a liberação automática de importação. Assim, quando chegar uma máquina, ela precisa comprovar que atendeu a Lei brasileira, que existe um responsável técnico que recolheu o Crea e emitiu uma ART, que existe um manual em português e uma assistência técnica que garanta peças de reposição no Brasil. “Se o fabricante tem que fazer porque o importador não? A obrigatoriedade já existe, mas a barreira à liberalização automática de importação ainda não. E só estamos pedindo que para liberar a importação de qualquer máquina se comprove o cumprimento da Lei. O Ministério do Trabalho só precisa fazer a exigência ao Ciscomex. São muitas frentes de discussão porque a norma tem muitas partes de interpretação confusa que precisam ser corrigidas”, diz Sr Righetti.

A segurança do trabalho é um ótimo negócio hoje, mas chegar a isso só prova que existe um descaso muito grande com a lei e com o ser humano. Segundo Sidney, o parque de máquinas nacional está mesmo sucateado, muito por falta de visão dos empresários. Claro que existem empresas que foram modernizadas nos últimos 15 anos mas há muito o que fazer. A falta de recursos pode ser um motivo pontual porque, ainda que exista uma linha de crédito específica para se adequar às normas de segurança, o Moderniza BK, uma linha do BNDES, de fato não é um crédito fácil. O BNDES reativou em outubro de 2015 a linha Finame Moderniza BK, destinada à modernização de equipamentos e voltada para empresas de todos os portes e faturamentos, para adequação à NR 12. O banco colocou à disposição R$ 500 milhões e o crédito esteve disponível até 31 de março de 2016. Agora é esperar pelo próximo levantamento para ver se alguma coisa mudou.
 
 
 
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